quarta-feira, 2 de junho de 2010

A montanha pariu um sapo

O apoio da Mesa Nacional do Bloco de Esquerda à candidatura presidencial de Manuel Alegre não respeita os princípios que foram definidos na última Convenção Nacional do partido nem os pressupostos em que diz assentar. É por isso que subscrevo a proposta de realização de uma Convenção Extraordinária para discutir a questão. Também é por isso que não apoio e não voto na candidatura de Manuel Alegre.

1. A orientação aprovada na Convenção definia que "O Bloco de Esquerda defenderá a necessidade de uma candidatura presidencial da convergência mais ampla possível para a luta política da esquerda, sem prejuízo da possibilidade de apoiar uma candidatura da sua área política no caso em que essa alternativa não se concretize".

É verdade que Manuel Alegre participou em algumas iniciativas de convergência entre diversas correntes ou pessoas das esquerdas. Foram iniciativas sectárias em relação à participação do PCP, por exemplo, mas não deixaram de ser mobilizadoras. No entanto, pouco tempo depois, já Alegre estava ao lado de Sócrates, a apelar à maioria absoluta do PS, nas eleições legislativas. De resto, quando votou contra o seu partido em alguma (e importante) legislação laboral, Alegre nunca provocou a derrota das propostas do PS, como recentemente lembraram dirigentes socialistas. Como escrevi há uns meses, Alegre dificilmente contribuirá para alguma convergência nas esquerdas.

2. Na resolução aprovada a 17 de Abril pela Mesa Nacional do Bloco de Esquerda escreve-se que "a acção do Bloco de Esquerda nas eleições presidenciais é uma parte essencial da sua luta para derrotar o PEC e as políticas liberais".

Se assim é, Alegre não é o candidato certo. Durante as semanas que se seguiram a esta resolução, as esquerdas mobilizaram-se para enfrentar o PEC, no Parlamento, em comícios, na grande manifestação de Lisboa. Alegre, pelo contrário, esteve sempre silencioso e chegou mesmo a mostrar "compreensão" pelas propostas do PEC, defendendo o governo e esperando o apoio do PS, que se confirmaria. Hoje, combater o PEC é também combater Manuel Alegre.

3. Este silêncio de Manuel Alegre não era difícil de prever e marca o seu compromisso com a direcção do PS, a sua cumplicidade com o governo e uma enorme diferença em relação à sua anterior candidatura, quando enfrentou o seu partido, com propostas autónomas e suportado por um amplo movimento de cidadania. Consciente de que esse movimento não é suficiente para assegurar as suas ambições presidenciais, a candidatura que agora se apresenta é suportada por dois partidos e refém dos inerentes compromissos. Ou pelo menos, como se tornou óbvio, refém dos compromissos assumidos com José Sócrates. Até Fernando Nobre, um candidato que não pretende assumir-se à esquerda, assumiu críticas mais claras e contundentes em relação ao PEC e ao programa de privatizações do governo do que Manuel Alegre.

4. José Sócrates habituou-nos a um estilo de governação e comunicação em que a palavra vale pouco: pode dizer-se hoje o que se quiser e fazer depois outra coisa qualquer. Lamentavelmente, também o Bloco segue esta linha quando um seu dirigente afirma, em plena Convenção Nacional, ser "uma fantasia" a hipótese de o BE apoiar o mesmo candidato presidencial que o governo, para, um ano e meio depois, se verificar que estão na mesma Barca Alegre, o Bloco e o Governo. Não é assim que se constrói uma "Esquerda de Confiança".

Compreende-se que seja uma situação incómoda, constatado o triste percurso de Manuel Alegre nos últimos dois anos (já para não ir mais longe). Não deixa de ser sintomático verificar que uma das pessoas que no PS votou contra o apoio à candidatura de Alegre foi Edmundo Pedro, que recordo ter visto no famigerado encontro do Teatro da Trindade. Não é uma convergência: é uma resignação à falta de alternativas, que levará alguns socialistas e alguns bloquistas a votar contrariados num candidato em que não ser revêm. Não vou por aí.

João Romão - Lisboa

3 comentários:

Luis Costa disse...

Cocordo com o que o camarada João Romão escreveu.
Eu não votarei Alegre nem estarei na campanha, pois nunca votarei contrariado.

Luis Costa
4022- Faro.

Anónimo disse...

Um sapo acamaleado, velho, gordo e barbudo!

Paulo F. Silva - 1201 - Rio Tinto, aka Gondomar

josé manuel faria disse...

João Romão explica como ninguém o Não a Alegre. A CP do BE meteu-se numa trapalhada, porque quis ser o primeiro a apanhar o comboio, só que este desloca-se para Sócrates, e o BE queria o contrário.

José Manuel Faria, 364 - Vizela